terça-feira, 5 de abril de 2016

A criança e a dificuldade de confiar

Existe uma lenda que conta que, quando a grande biblioteca de Alexandria foi queimada, um livro foi salvo. Mas não era um livro de muito valor, por isso um homem pobre, que pouco sabia ler, comprou-o por uns tostões. O livro não era realmente muito bom, mas nele havia algo interessantíssimo. Era um tipo de pergaminho, no qual estava escrito o segredo da "pedra de toque".

A pedra de toque era uma pedrinha comum, que podia transformar qualquer metal em ouro puro. No pergaminho estava escrito que era encontrada nas praias do Mar Negro, misturada a outras milhares e milhares de pedras exatamente iguais a ela. Mas o segredo era este: a pedra real era quente, enquanto as outras eram frias. Então, o homem vendeu os seus poucos pertences, comprou alguns mantimentos e foi acampar na praia, onde começou a testar as pedras.

Esse era seu plano: ele sabia que se pegasse as pedras comuns e as jogasse de volta ao chão, poderia pegar a mesma pedra centenas de vezes. Então, quando pegava uma fria, ele a jogava ao mar. Assim, passou uma semana, um mês, um ano, três anos... e o homem não encontrava a pedra de toque. Mas, mesmo assim, ele continuava: pegava uma pedra, era fria, jogava-a no mar... e assim por diante. Imagine o homem fazendo isso por anos e anos: pegar uma pedra, senti-la fria, jogá-la no mar... de manhã até a noite, por anos e anos.

Mas, uma manhã, ele pegou uma pedra que estava quente, e jogou-a no mar. Ele criara o hábito de jogar as pedras no mar, vocês compreendem, e o hábito fez com que ele jogasse a pedra quente também, quando finalmente a encontrara. Pobre homem!

É assim que a mente funciona.

A confiança é uma pedra de toque. Muito raramente você encontra alguém em quem você pode confiar. Muito raramente você encontra um coração quente, amoroso, no qual pode confiar. Normalmente, você encontra pedras que parecem a pedra de toque, quase iguais, mas São frias. Por anos, desde a infância, você pega uma pedra, sente-a fria, e a joga no mar.

Um dia é um fenômeno muito raro - você encontra a verdadeira pedra de toque. Você a pega, sente que é quente, mas, mesmo assim, você a joga. Então, você irá chorar, sem saber como isso pôde acontecer. É um simples mecanismo. Desde a infância, você aprende a desconfiar. Você é educado de tal maneira que não pode confiar. A dúvida foi colocada bem fundo no seu ser. Na verdade, é uma medida de segurança: se não duvidar, não sobreviverá. Você tem que olhar o mundo com olhos hostis, como se todos fossem seus inimigos. Ninguém é quente, ninguém é uma pedra de toque. Você não pode confiar nem em seus pais. Aos poucos, a criança percebe que não existe ninguém em quem pode confiar. Os pais são muito contraditórios: dizem uma coisa e fazem outra. A criança sente-se confusa; é difícil para ela entender o que realmente a mãe quer. Na verdade, nem a própria mãe sabe. E, cada vez mais, a criança sente que é impossível confiar em alguém.

OSHO

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Postagens populares

"É porque se espalha o grão que a semente acaba
por encontrar um terreno fértil."-
Júlio Verne


>>>>>>>>>>>>>>

"A aventura é, sempre e em todos os lugares, uma passagem pelo véu que separa o conhecido do desconhecido; as forças que vigiam no limiar são perigosas e lidar com elas envolve riscos; e, no entanto, todos os que tenham competência e coragem verão o perigo desaparecer." — Joseph Campbell em, O Herói de Mil Faces

"Acredito que o maior presente que alguém me pode dar é ver-me, ouvir-me, compreender-me e tocar-me. O maior presente que eu posso dar é ver, ouvir, entender e tocar o outro. Quando isso acontece, sinto que fizemos contato" — Virginia Satir

"A mente inocente é aquela que não pode ser ferida. Uma mente sem marcas de ferimentos recebidos — eis a verdadeira inocência; temos cicatrizes no cérebro e, com elas, queremos descobrir um estado mental sem ferimento algum. A mente inocente não pode ferir-se (isto é, sofrer ofensa), porque nunca transporta um ferimento de dia para dia. Não há, pois, nem perdão, nem lembrança.[...] A mente em conflito não tem nenhuma possibilidade de compreender a Verdade" — Krishnamurti