Por que você não se acha num estado de revolução? Por que não há em você o novo processo da vida? Por que não há em você uma nova maneira de considerar a vida, uma chama, um tremendo descontentamento? Por que? Um homem que está completamente insatisfeito, não só com certas coisas, mas inerentemente insatisfeito, não necessita de técnica alguma para ser revolucionário. Mas, por que você não é um homem assim? Para mim, o que importa não é a técnica, mas, sim, o fazer-lo revolucionário, ajudar-lo a despertar, para perceber a importância da completa transformação. E quando VOCÊ estiver transformado, poderá então agir, porque haverá aquele constante fluir de seiva nova, que é, afinal de contas, revolução.
Consequentemente, para mim, a importância da revolução interior, da transformação psicológica, é muito maior do que a revolução exterior. A revolução exterior é mera modificação, que significa continuidade modificada, mas a revolução interior não tem pouso de descanso, não tem parada, está em constante renovação. E é disto que necessitamos no presente momento: um povo completamente descontente e capaz, portanto, de discernir a verdade das coisas. O homem complacente, o homem que se satisfaz com dinheiro, com posições, com uma ideia, É INCAPAZ DE PERCEBER A VERDADE. Só o homem que está descontente, o homem que investiga, que pergunta, que duvida, que observa, SÓ ESSE HOMEM DESCOBRE A VERDADE; ele é uma revolução em si mesmo e, portanto, nas suas relações. E, consequentemente, aquilo que constitui o seu mundo — ou seja as suas relações com outro — ele começa a transformar. E influencia, desse modo, o mundo compreendido na esfera de suas relações. Assim sendo, se você meramente procura uma técnica, ou indaga qual é a minha técnica para a nova revolução, isso me parece fora de propósito, ou melhor, parece indicar que você não percebe a importância de estar revolucionado em si mesmo; e, para você ser uma revolução em si mesmo, é necessário que desperte para o ambiente, para o meio em que você vive.
Toda sociedade nova, toda civilização nova, deve ser começada por você. Como foi que começou o cristianismo, o budismo, e todo movimento significativo? Pela iniciativa de uns poucos VERDADEIRAMENTE INFLAMADOS pela ideia e pelo sentimento. Eles tinham os corações abertos para uma nova vida. Constituíram um núcleo, não tinham crença numa determinada coisa, mas TINHAM EM SI PRÓPRIOS A EXPERIÊNCIA DA REALIDADE — a realidade daquilo que viam. E o que nos cabe fazer, a você e a mim, é, se posso sugerí-lo, vermos as coisas por nós mesmos e não através de uma técnica . Você pode ler um poema de amor, mas se não houver sentido, como experiência, o que é o amor, por mais que tenha lido, por melhor que tenha aprendido a técnica, , não conhecerá o perfume do amor. E como não possuímos esse amor, andamos em busca de uma técnica. Estamos exaustos e famintos, e estamos, por isso, superficialmente `procura de uma técnica. Um homem faminto não procura técnica alguma. O que lhe interessa é o alimento e ele não fica à porra do restaurante a aspirar o cheiro da comida. Assim pois, quando você pede por uma técnica, isso denota que você realmente não tem fome. O "como" não é importante, mas a razão por que você pede esse "como" é muito importante.
Nessas condições, só poderá haver revolução, só poderá haver a continua revolução interior, quando você compreender a si mesmo. Você só pode compreender-se na vida de relação, e não no isolamento. Visto que nada pode existir no isolamento, a compreensão de si mesmo, o conhecimento de si mesmo, em qualquer nível que seja, só pode ser aprendido na vida de relação. E como a vida de relação é dolorosa e está em movimento constante, dela desejamos fugir e encontrar a realidade fora das relações. Não existe realidade alguma fora da vida de relação. Quando compreendo a vida de relação, esta mesma compreensão é a realidade. Por conseguinte, é necessário nos mantermos extraordinariamente vigilantes, despertos, vigilantes a todo momento, abertos a todo desafio e a toda sugestão ou alusão. Mas tal coisa exige um certo alertamento da mente e do coração, mas nós, em geral, vivemos dormindo, vivemos iludidos e, embora jovens, já temos um pé no túmulo. Porque só pensamos com propósito de obter sucesso, com propósito de obter ganho, nunca vivemos verdadeiramente; só nos preocupa o fim a que visamos; e porque só andamos a demandar um fim, somos gente sem vida. Por isso, nunca somos revolucionários. Se você estiver interessado diretamente na vida e no viver, e não na ideia relativa ao viver, não poderá então deixar de ser uma revolução em si mesmo. Você mesmo será uma revolução, porque estará enfrentando a vida diretamente, e não por detrás de cortinas de palavras, de preconceitos, intenções e fins. E o homem que enfrenta a vida diretamente é aquele que se acha num profundo descontentamento; e você precisa estar nesse estado de descontentamento, para encontrar a realidade. E a realidade é que liberta, que nos faz livres; é a realidade que liberta a mente de suas ilusões e criações. Mas achar a realidade, estar aberto, significa estar descontente. Você não pode procurar a realidade, ela tem de vir até você; mas, só poderá vir quando a sua mente estiver totalmente insatisfeita e pronta para recebê-la. Mas, em geral, temos medo de ficar descontentes, pois sabe Deus aonde esse descontentamento nos levaria. Por essa razão nosso descontentamento é circundado de segurança, de proteção, de ações sempre cuidadosamente planejadas. E um tal estado mental é incapaz de compreender a verdade. A verdade não é estática, porquanto a verdade está fora do tempo, e a mente não pode acompanhar a verdade, porque a mente é produto do tempo; e aquilo que depende do tempo não pode conhecer, como experiência, o que é o eterno. A verdade se manifesta ao homem que se acha naquele estado de descontentamento, mas não anda em busca de um fim; porquanto todo aquele que busca um fim está em busca de satisfação; e satisfação, aprazimento, não é a verdade.
Jiddu Krishnamurti em, Que te fará feliz?
Jiddu Krishnamurti em, Que te fará feliz?
16 de janeiro de 1949
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